Ser, crescer, transfigurar!

portinari

Nos filmes e nas novelas há sempre figurantes. Têm importância na composição das cenas, mas o papel é secundário. Não são protagonistas.

No sistema capitalista dominante no mundo, somos, quase todos, peças de uma engrenagem imensa, manipulados pela “mão invisível do mercado”. Na atualidade, as big thecs são mais avassaladoras que as grandes corporações bancárias, e controlam até nosso imaginário – o que lemos, como vemos…

E a ganância em sugar os recursos da Mãe Terra tem levado à sua desfiguração, pela sobrecarga.

Pois a leitura do Evangelho de Mateus (17, 1-9), nesse domingo, é uma exortação a que não sejamos, no teatro da vida, meros figurantes, massa consumidora acrítica, cúmplices despersonalizados da devastação.

A luminosa transfiguração de Jesus, após subir “alta montanha”, é um desafio: elevemo-nos!

Nada de prostração, de cara no chão! Busquemos os que nos antecederam, nossos ancestrais, com seus exemplos de enfrentamento aos opressores, pretensos senhores das nossas vidas. Como Jesus, que reencontra a boa companhia de Moisés e Elias, em sua coragem profética nos embates contra faraós e reis.

Como Jesus, saibamo-nos “filhos amados”. Ele nos toca: “levantem-se, não tenham medo!”. Deus pede que o ouçamos na sua e nossa missão de amar sem limites e cuidar da Casa Comum, contra tudo que a desfigura, deforma e transtorna. É isso que nos transfigura!

É linda a imagem de Jesus “com o rosto brilhante como o sol e as vestes alvas como a luz”. Ali também está simbolizada nossa vocação à plenitude, à integralidade do ser, superada a nuvem opaca do ego e do ter.

Nosso protagonismo na caminhada pede mais autenticidade que milagre: “isso de ser exatamente o que se é ainda vai nos levar além”, lembrou o transfigurador de palavras Paulo Leminski (1944-1989).

Não nos acomodarmos à mera figuração exige humildade – reconhecimento de nossas limitações – e ousadia: “meu caminho pelo mundo, eu mesmo traço/a Bahia já me deu régua e compasso!” (Gil, “Aquele abraço”).

Frente à mediocridade imposta, à indução ao consumismo, à anticultura da discriminação, à economia da precarização do trabalho e dos direitos, à naturalização da agressão, à banalização da morte (78 anos da bomba de Hiroshima hoje, seus fragmentos continuam matando), à doença da “normose” resignada, transfiguremo-nos!

Mudar de olhar e de postura, vestirmo-nos com a roupa leve da solidariedade, da ternura e da Justiça é para aqui e agora, desde já.

“No coração da mata/ gente quer prosseguir/ quer durar, quer crescer/ gente quer luzir!” (Caetano, “Gente”).

Não nascemos para ser sempre figurantes, mas para mudar, luzir, transfigurar!

“Transfiguração de Jesus” – Cândido Portinari (1903-1962), tela na igreja matriz de Bom Jesus da Cana Verde – Batatais (SP)

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