Hoje, em milhares de igrejas do planeta, é ouvido um trecho intrigante da palavra de Jesus (Lucas, 6, 27-38): “amem os seus inimigos, façam bem aos que os odeiam, rezem pelos que os caluniam. Se levarem um tapa, deem a outra face (…) Se vocês amam somente aqueles que os amam, se fazem o bem apenas aos que lhes fazem o bem, que gratuidade é essa?”.
Não se trata de um apelo à resignação. Na sociedade violenta, agressiva e discriminatória em que vivia Jesus, é uma exortação revolucionária: CONTRAPODER!
Desafio a uma postura que quebra a corrente do ódio, que interrompe a espiral da violência. Proposta de uma atitude que desconcerta o “inimigo”, o “caluniador”, o opressor (sim, Jesus os menciona; eles existem na sociedade conflituosa daquele tempo e de agora). Usar o método e o discurso do inimigo, “pagar com a mesma moeda” é entrar no seu jogo sujo.
No plano das relações pessoais, não há melhor maneira de reagir a quem grita, histérico, do que responder em voz baixa, serena, pedindo, antes de mais nada, calma e reflexão. Compreensão não é humilhação. “Dar a outra face” – sem descuidar da autodefesa no caso de violência física – inibe o agressor, trava a arma da brutalidade.
Na tradição espírita, a interpretação dessa passagem é um pouco diferente. “Fazer o bem a quem faz mal” é mostrar o outro lado, como na oração atribuída a Francisco de Assis: “onde houver ódio, que eu leve o amor; onde houver ofensa, que eu leve o perdão; onde houver desespero, que eu leve a esperança, onde houver trevas, que eu leve a luz…” .
No âmbito histórico-social, não é estímulo à passividade ou ao conformismo. É militância transformadora, é gesto na contracorrente dos costumes dominantes. Alías, na encíclica “Populorum progressio”, de 1967, o papa Paulo VI legitima “a insurreição revolucionária, em casos de tirania evidente e prolongada, que ofendesse gravemente os direitos fundamentais da pessoa humana e o bem comum do país”.
O caminho que essa palavra de Cristo inspira é o da Não-violência ativa, praticada, em nosso tempo, por Gandhi (1869-1948), Luther King (1929-1969) e d. Helder Câmara (1909-1999), entre tantas outras pessoas de boa vontade, construtoras de um novo mundo possível – igualitário, justo e fraterno: “amar os amigos, desarmar os inimigos”. Gandhi e Luther King, pacifistas radicais, incomodaram tanto que foram assassinados.
O essencial da reflexão de hoje, porém, está no versículo 31: “o que vocês desejam que os outros lhes façam, façam vocês também a eles”. O dever da reciprocidade. Se essa fosse a regra de vida imperante nas sociedades, nosso mundo seria outro.
Façamos a nossa parte, sejamos, desde já, a mudança que queremos ver no planeta.
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