Hoje é relembrado, em milhares de igrejas cristãs do mundo, o batismo de Jesus. É a continuidade do fundamento central do cristianismo, depois do Natal e da Epifania (e dos Reis Magos): o sagrado se manifestando no humano. A nossa possibilidade de transcendência, “a eternidade penetrando nas artérias do tempo” (Emmanuel Mounier, 1905-1950).
Como andam distantes dessa grandeza os rituais de batismo, tornados tantas vezes meras convenções sociais! Aliás, o batismo de criancinhas de colo só começou a ser feito no século III d.C. Os padrinhos e madrinhas sabem de suas responsabilidades?
Batismo é renascimento. João, o Batista, disse que depois dele viria alguém maior, de quem não era digno “de desatar as correias das sandálias” (Lucas, 3, 15-16). Lição de humildade.
Jesus entra na fila do povo, para ser batizado nas águas do Jordão. Lição de simplicidade. João, profeta contestador, odiado por Herodes, anuncia: “eu batizo com água, o que vem batizará no Espírito e no fogo”.
Batismo é transformação de vida: limparmo-nos com a água, secar nossas inevitáveis feridas com o fogo, elevarmo-nos no Espírito, aprendendo a olhar para fora – até às estrelas, até o Deus cósmico – e para dentro de nós mesmos, onde se escondem nossas mesquinharias.
Batismo é superação, que exige também recolhimento. Como o de Jesus, que constantemente se retirava em oração (Lucas, 3, 21-22). Longe do alarido do mundo (do qual jamais fugia, buscava o silêncio para melhor enfrentá-lo), podia ouvir a voz de Deus – que está nas Escrituras de todas as religiões e também na poesia, na música, na palavra generosa inclusive de quem não tem fé. Voz que fala de Seu bem querer por cada um(a) de nós.
Batismo é sabermo-nos filho(a)s bem amado(a)s. É, por consequência, agirmos como irmãos, sem discriminação, acreditando na essencial igualdade entre todos os humanos. O Espírito Santo ganha a forma de uma pombinha: batismo é saber do nosso parentesco com tudo o que tem patas, raízes e asas. É estado de comunhão com o Universo. É render graças, mesmo em meio a tantas desgraças.
Batismo em África: “eu não prego ‘evangelho social’, prego o evangelho, ponto. O de Jesus Cristo, que se preocupa com a pessoa como um todo. Quando elas estavam com fome, Jesus não perguntava: ‘isto é político, é social?’. Dizia: ‘eu alimento você!’. Uma boa notícia para a pessoa com fome é o pão” (Desmond Tutu, 1931-2021)