O Evangelho desse domingo (Lc, 3, 1-6, 2º do Advento), ouvido em milhares de comunidades cristãs do mundo, é curto e contundente.
Não foge do mundo e situa historicamente o tempo de Jesus: menciona a dominação imperial romana, governadores “capachos” da Judéia, Galiléia e outras regiões, cita os sumos sacerdotes, “terrivelmente” supremacistas. Mas a Boa Nova não será anunciada nos palácios nem no Templo.
O deserto é o oposto do Poder, do estridente “lugar de fala” de quem manda e oprime. Isaías (século VII a.C.) prenuncia a “ira santa” de João Batista, precursor de Jesus: é “a voz que grita no deserto” e anuncia que “todo vale será aterrado, toda montanha e colina serão aplainadas, as curvas ficarão retas e os caminhos esburacados serão nivelados”. Contrapoder. Para superar a dor, mudança profunda e radical.
Mudança em nós: conversão na direção do bom, do belo, do justo, do amoroso, que nos liberta e eleva, para contemplarmos o nosso “oriente interior” tantas vezes esquecido. Mudança na sociedade, para lutarmos contra toda injustiça, desigualdade e crueldade, sem o que não há paz. É essa postura profética e transformadora que prepara o Natal.
Nada de luxo, cerimônias, símbolos dourados dos poderosos que se julgam invencíveis no seu conluio hipócrita. Longe da riqueza, dos “glórias!” armamentistas e da mentira, o deserto. Fértil no seu abandono, na imensidão silenciosa dos campos. No despojado presépio, que é oásis, estrela aquecendo o frio da noite: “no ventre de Maria/ Deus se fez homem./ Mas, na oficina de José,/ Deus também se fez classe” (Pedro Casaldáliga, 1928-2020).
Como estamos preparando os caminhos do Emanuel, “Deus conosco”?
PS: hoje, domingo, 5/12, a convite da Reverenda Inamar Souza, faço a reflexão desse tema na Celebração da Igreja Anglicana de Santa Teresa (Rio, rua Paschoal Carlos Magno, 95, às 11 h). Aberta a tod@s.