Hoje, em comunidades católicas e anglicanas do mundo inteiro, termina o ano litúrgico. Com um coroamento: é a festa de Cristo, Rei do Universo.
Que rei é Jesus Cristo? O Evangelho de João explica (Jo 18, 33b-37): um rei de um reino que “não é deste mundo” – rei antimonárquico, rei sem pompa e circustância, sem poder opressor, sem súditos.
Cristo é rei sem trono, e sim com a mesa da comunhão. Rei sem coroa de ouro e diamantes, e sim com uma de espinhos. Rei torturado e condenado à morte mais humilhante pelos reis de seu tempo. Rei derrotado, mas triunfante: vitória advinda do fracasso naquele mundo dominante.
Um rei sem exércitos! Um rei desarmado, que abraça a Humanidade amada! Um “antirrei” cujo cetro é um cajado, peregrino descalço da verdade, da justiça e da paz. Um rei que veio para anunciar a nossa realeza de seres humanos capazes de compreensão, solidariedade e, sobretudo, amor.
“Todo menino é um rei”, cantaram Roberto Ribeiro (1940-1996) e Nelson Rufino: “menino pensando só/ no reino do amanhã/ na deusa do amor maior/ nas caminhadas sem pedras/ no rumo sem ter um nó”. Cristo é um rei menino, ao anunciar, atendendo à pureza do nosso querer original, um “fardo leve”, um “julgamento suave”.
Sim, a pequena realeza para a qual somos chamados é a conquista não de impérios e territórios, mas de caminhos de vida fraternos. Aqueles onde as inevitáveis “forças inimigas” do egoísmo, da indiferença, da doença e da solidão sejam derrotadas pela fé. Serena fé na vida e em novas formas do viver, que o “tempo rei” ensina e exige.
Nosso reino – venha a nós! – é também o das “Reinações de Narizinho”, obra inaugural da literatura infantil brasileira, escrita em 1931 por Monteiro Lobato (1882-1948). Reinações – no Sítio do Pica Pau Amarelo, no Reino das Águas Claras, no País das Fábulas ou onde quisermos – que nos encantam de utopia! Não para ficarmos acomodados na fantasia, mas para nos ajudar a caminhar, na contramão da “objetividade” do mundo do mercado, do capital, que tudo compra e precifica – até nosso sentido de vida.
Nosso reino, como o de Jesus, não é deste mundo. É de outro, transformado, possível e necessário. “O reino dos céus está dentro de nós” (Lc, 17, 20-21). Começa aqui e agora, em nossa luta comum por uma sociedade igualitária, sem exclusão, racismo, preconceito, exploração. Celebremos!
Cristo Rei quebrando o rifle – xilogravura de Otto Pankok (1950). (Artista alemão muito atacado pelos nazistas)