Ontem, integrantes de diversos movimentos sociais fizeram um ato em frente à Bolsa de Valores de SP e ocuparam, por uma hora, o espaço do pregão. Ali fizeram um jogral demonstrando as contradições do mercado financeiro bilionário (para alguns) e a falta de políticas sociais e distributivas, que leva o país à crescente miséria, com 19 milhões de pessoas passando fome. A própria direção da B3 reconheceu que o ato foi pacífico e não houve qualquer dano às suas instalações.
O tal “mercado” – esse ente oculto humanizado que tem humores e interfere pesado na política – é cruel até mesmo para pequenas empresas estreantes da Bolsa: de 46, 23 perderam valor, se lascaram, este ano.
O ato do MTST e da Frente Brasil Popular criou uma cena inusitada e realista no “cassino dos papéis”: no espaço frenético dos “grandes negócios” (e negociatas), pessoas pobres, a maioria mulheres, inclusive portando ossos de boi – que é o que tem restado para muitos se alimentarem -, lembraram que a inflação galopante afeta sobretudo os mais pobres. E que ninguém se alimenta de “ações” da especulação financeira. Um choque de realidade!
A era do capital financeiro transnacional tem contradições tremendas. Sim, ninguém que dispõe de dinheiro vai guardá-lo no colchão, mas o mundo das Bolsas é marcado por rasteiras, informações privilegiadas e tenebrosas transações. Não produz riqueza real.
João Paulo Pacífico é um jovem que trabalha no mercado de capitais. Fundou o Grupo Gaia, para captar recursos para projetos produtivos de cunho social. Conta as dificuldades para conseguir financiamento para cooperativas ligadas ao MST, através do Certificado de Recebíveis do Agro (CRA) para produtores orgânicos: “Primeiro a CVM disse que não estava clara a ‘legalidade’ das cooperativas, depois o agronegócio pressionou contra e até advogados se recusaram a defender a operação. Mas vencemos, com alguns ricos, classe média e mesmo pobres aplicando, de R$ 100 a milhares”.
E conclui, mostrando que ações de papel não têm valor em si: “Quanto mais você planta, mais ganha. A gente sabe que meritocracia na Faria Lima não existe. Se você for homem, branco e rico, beleza. Se for mulher, mais difícil. Negro, sem chance. Homossexual não passa na porta. (…) Consumir é um ato político, e investir, para quem pode, também. Tento usar o mercado financeiro em prol do meio ambiente e da justiça social. Quero contribuir também com os povos originários, indígenas e quilombolas”.
Como já disse Galileu (1564-1642) no sufoco da (nada) Santa Inquisição, “apesar de tudo, algo se move”…