No trecho do evangelho (Mc, 4, 26-34) que milhões de cristãos ouvem nesse domingo, nos templos (bem distanciados, espera-se) ou em casa, Jesus de Nazaré é convincente e fascinante. Para falar de coisas profundas, faz alegorias, comparações com o que é natural, cotidiano, simples.
Nas parábolas relatadas por Marcos, aborda a aspiração – que reside em todo coração humano – pela plenitude, pela imortalidade, pelo paraíso perdido. Aruanda das religiões de matriz africana, nirvana dos budistas, jannah dos muçulmanos. O Reino de Deus que não “cai do céu”, mas é construção lenta, paciente, amorosa e solidária – aqui, agora.
Jesus queria se fazer entender (quanta gente por aí, cheia de boas intenções, não se comunica bem!) e simplifica: fala da semente que brota, silenciosa e misteriosa, no coração da terra. Conta sobre o grão de mostarda – não da hortaliça mas do arbusto (comum na Palestina), cuja semente de 2 milímetros germina e cresce até 3 metros.
Nossa vida devia ser sempre uma paciente semeadura. Voltada para a tarefa de “plantar árvores sob cuja sombra talvez não descansaremos” (Rubem Alves, 1933-2014). Sem oportunismos e imediatismos. Nossa vocação é a de agricultoras ou jardineiros, para cuidar desse imenso campo que nos é dado, a Terra.
Terra calcinada por guerras e agrotóxicos, plantadore/as impedidos de realizar sua vocação pela injustiça social e falta de oportunidades – que sobram para uns poucos e faltam para muitos.
Mas, independentemente do sucesso, é à essa tarefa que todo/as – crentes ou não – somos chamados: semear generosidade, espalhar sementes de consciência coletiva, crítica e solidária, plantar no hoje, tão cheio de trevas, a luz que amanhecerá. Amanhã será…
Mesmo que não vejamos o dia raiar, ajudemos a madrugar, a fazer vir o tempo da perene delicadeza. Plantando o que vai frutificar em cada mínimo gesto e nos grandes movimentos da História. Como disse d. Paulo Evaristo Arns (1921-2016), defensor dos direitos humanos, cardeal de São Paulo, “tudo vem das pequenas coisas, especialmente as grandes”.
OBS: hoje é dia de Santo Antonio, nascido em 1195 em Lisboa, transvivenciado em 1231, em Pádua (Itália). Um franciscano de todas as causas, notadamente da paciência e da duração do amor (daí ser tido como “casamenteiro”). Mais um semeador.
Foto: “O semeador”, Vincent van Gogh (1853-1890)